SALVANDO-SE DO ESQUECIMENTO
Referência aos vultos literários e outros, da nossa terra e vizinhos, de aquém e além, merecedores de memória, que se imortalizaram pelo legado artístico e, assim, libertando-se da lei da morte não caíram no vaso do esquecimento.
Servirá este espaço para apresentar excertos sobre poetas, dramaturgos, romancistas, contistas, cronistas e de todos aqueles que de uma forma ou outra se dedicaram à arte da escrita, exarando sobre a visão do(s) mundo(s).
Sebastião Pereira da Cunha (1850- 1896)
Poeta e prosador, senhor do castelo de Portuzelo, deixou várias obras como Saio da Malha, Serões de Portuzelo e Cidade Vermelha. Foi um dos últimos poetas românticos, reuniu várias vezes em sua casa, Guerra Junqueiro, António Feijó e outros vates do movimento romântico.
PORTOZELLO*
Do Minho cândida filha
O’ minha aldeia sem par,
Como és linda, prateada
N’uma noite de luar!
Tuas modestas casinhas
Nada, em graça, há que a eguale;
São como pérolas, soltas
Debruçadas sobre um valle.
Ao longe, o vulto massiço
De frondosos pinheiraes,
A roçarem pelas nuvens
Com as cimas colossaes.
O presbyterio, phantasma,
Que recorta o céo azul;
Um vergel cada montanha,
Um jardim cada paul.
Da egreja ao lado se altêa
Um gigantesco cipreste,
Verde columna, sustendo
Toda a abobada celeste.
O rio lá está... de manso,
Com a face a reluzir,
Qual vasto espelho... O’ meu Lima
E’s um sultão a dormir.
Dos altos montes a sombra
Vae-se no rio estampar,
E as capellas, que há por ellas
N’agua estão inda a alvejar
D’aquella encosta na espalda
Branda sussurra uma fonte,
E corta a musgosa relva
P’ra o rozal que está defronte.
Os roxinoes cantam lânguidos
D’entre o arvoredo gentil;
Nem têem fim aqui seus cantos,
Nem aqui tem fim Abril.
E em cada folha de arbusto,
E em cada estrella dos céos,
E em tudo... na minha aldeia
Soletro o nome de Deus.
* mantém-se a ortografia arcaica em todo o poema
Por Santa Marta de Portuzelo