POR SANTA MARTA DE PORTUZELO

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sábado, 12 de março de 2011

Salvando-se do Esquecimento .... P. António Vieira


Referência aos vultos literários e outros, da nossa terra e vizinhos, de aquém e além, merecedores de memória, que se imortalizaram pelo legado artístico e, assim,  libertando-se da lei da morte não caíram no vaso do esquecimento.
                Servirá este espaço para apresentar excertos  sobre poetas, dramaturgos, romancistas, contistas, cronistas e de todos aqueles que de uma forma ou outra se dedicaram à arte da escrita, exarando sobre a visão do(s) mundo(s).

P. António Vieira, Sermão de Santo António aos Peixes
               
                António Vieira nasceu em Lisboa, perto da Sé, no dia  6 de Fevereiro de 1608. Aos seis anos partiu com a família para o Brasil, e foi no colégio de Jesuítas, na Baía, que fez os seus estudos, revelando, desde cedo, a sua superior inteligência. Em 1623, entrou na Companhia de Jesus e inicia uma carreira invulgar. O pregador de prestígio, o missionário de vocação, o diplomata de longa carreira e o visionário do V Império, são os tópicos que se podem desenvolver do “Imperador da Língua Portuguesa” (Fernando Pessoa) que morreu na Baía, em 1697, com 89 anos.


                “Mas já que estamos nas covas do mar, antes que saiamos delas, temos lá o irmão polvo, contra o qual têm as suas queixas, e grandes, não menos que S. Basílio e Santo Ambrósio. O polvo com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge; com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela; com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa, testemunham constantemente os dois grandes Doutores da Igreja latina e grega, que o dito polvo é o maior traidor do mar. Consiste esta traição do polvo primeiramente em se vestir ou pintar das mesmas cores de todas aquelas cores  a que está pegado. As cores, que no camaleão são gala, no polvo são malícia; as figuras, que em Proteu são fábula, no polvo são verdade e artifício. Se está nos limos, faz-se verde; se está na areia, faz-se branco; se está no lodo, faz-se pardo; e se está em alguma pedra, como mais ordinariamente costuma estar, faz-se da cor da mesma pedra. E daqui que sucede? Sucede que o outro peixe, inocente da traição, vai passando desacautelado, e o salteador, que está de emboscada dentro do seu próprio engano, lança-lhe os braços de repente, e fá-lo prisioneiro. Fizera mais Judas? Não fizera mais; porque nem fez tanto. Judas abraçou a Cristo, mas outros o prenderam; o polvo é o que abraça e mais o que prende. Judas com os braços fez o sinal, e o polvo dos próprios braços faz as cordas. Judas é verdade que foi traidor, mas com lanternas diante; traçou a traição às escuras, mas executou-a muito às claras. O polvo, escurecendo-se a si, tira a vista aos outros, e a primeira traição e roubo que faz, é à luz, para que não distinga as cores. Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é menos traidor!”
                                                                                                              Sermão de Santo António aos Peixes


Por Santa Marta de Portuzelo