O
livro verde “Reorganização da Administração local” é assunto que está na ordem
do dia, provavelmente não merecerá o debate público que o mesmo exigiria,
porque os portugueses têm outro tipo de preocupações muito mais urgentes,
relacionadas com a sua qualidade de vida ou até com a sua sobrevivência.
Fui
Presidente de Junta em dois mandatos (1989-1997).
Assumi
entre 1992-1994, várias posições públicas do interesse na associação de
freguesias, a que chamei ao tempo pólos/núcleos de desenvolvimento, com o
objetivo de rentabilizar recursos humanos, meios e equipamentos públicos, já
que os próprios planos diretores municipais não davam resposta.
Defendo
a reorganização das freguesias pelo referido no parágrafo anterior e hoje, quer
em termos de tecnologias, quer em termos de acessibilidades, está tudo muito
mais perto.
Sou
um acérrimo defensor do poder local e tenho consciência que muita da qualidade
de vida e serviços de que a população usufrui se deve ao referido poder.
Isto
não invalida que não reconheça os grandes constrangimentos para as populações,
por uma questão de identidade/história, sentimento/emotividade, pelas
consequências em termos de desertificação, até porque muitas já perderam a
escola, os transportes públicos, o padre, o carteiro e até a mercearia, e agora
perdem o “poder de proximidade” o último recurso para muitos.
Por
experiência própria, o Presidente de Junta é o apaziguador dos conflitos, o que
resolve o problemas aos que não têm abrigo ou comida, o responsável pelo
caminho intransitável, pelo transporte dos doentes e das crianças, pelo
funcionamento das escolas, pelas coletividades e por um cem número de tarefas e
atividades que resolvem os problemas às pessoas e, fundamentalmente, humaniza a
relação e a vida das mesmas.
Não
tenho dúvidas de que é muito mais importante para as pessoas, a proximidade do
Presidente de Junta do que o poder “distante” da Câmara.
Agora e, por muito
contraditório que possa parecer ao leitor, sou totalmente contra a proposta
apresentada “livro verde”, por considerar uma falta de respeito pelas
populações e pelo elo mais fraco (Juntas de Freguesia) e por refletir o medo que
existe em defrontar a associação nacional de municípios.
Se
o objetivo (acordo com a troika) tem implícito recursos humanos e eficácia, o
mesmo acaba por ser essencialmente de natureza económica, mas o verdadeiro
problema não está nas freguesias.
Não
basta repensar a reorganização e funcionamento das diferentes “estruturas” do
poder municipal, atribuição de novas competências, tudo isto é muito importante
mas é insuficiente, para aquilo que deveria ser uma verdadeira reforma.
Se
pretendermos uma reorganização do poder local, séria, responsável, a pensar no
País e nas populações, vamos começar pelos concelhos (independentemente da riqueza
histórica dos mesmos). Há sedes de concelho e até concelhos que praticamente
não reúnem condições, para se organizarem, nos termos propostos para as
freguesias.
Hoje,
a existência das comunidades intermunicipais reforça o meu pensamento, até nas
próprias áreas metropolitanas, não haverá nada a reorganizar? – Aliás há
Presidentes de Câmara que, de forma responsável, têm tornado público esse
interesse.
Mas
voltando às freguesias e aos custos que é a grande razão da pretendida reforma
questiono e sugiro:
- Quanto vão ganhar os Presidentes de Junta
nas freguesias com mais de cinco mil eleitores?
-
Para garantir o mesmo serviço (qualidade) quanto não vai custar ao erário
público?
-
E por que não deixar de pagar aos membros das mesas de voto nos atos eleitorais,
visto tratar-se de um ato de cidadania?
Façam
as contas e chegarão à conclusão que é pior a emenda que o soneto.
Se
o “livro Verde” não é suficiente, pensem num de outra tonalidade. Não basta ter
poder, é fundamental querer exercê-lo e saber resistir aos lóbis, uma reforma,
entre outras, das mais importantes em termos demográficos, sociológicos de
identidade e até de pertença, não se pode resumir a aniquilar o elo mais fraco, pelo que,
independentemente das propostas apresentadas, das justificações e argumentação
político/partidária, jamais concordarei com o projeto em discussão que apenas
servirá para dividir os portugueses quando o momento exige coesão.
Carlos Antunes