Independentemente da sensibilidade humana para os valores da vida, o
Natal é sempre uma quadra que não nos deixa indiferentes, que tende a aproximar
os homens e os povos, mesmo quando a indiferença e a frieza tornam gélida a sobrevivência.
Há muitos anos que gosto de partilhar o meu pensamento natalício com os
santamartenses e com todos aqueles que ainda têm paciência para lerem o que
escrevo.
Quando escrevemos, consciente ou inconscientemente, acabamos por
transmitir o nosso estado de espírito, as nossas emoções, convicções e a
esperança que depositamos em algo, seja utópico ou real, ou então como mera
reflexão.
Nos últimos dias foi publicado um trabalho jornalístico, a propósito da
pobreza, com incidência no estudo da situação em que vivem os idosos (seres
humanos com mais de 65 anos). Ficamos a saber que temos mais de dois milhões de
idosos, destes, quatrocentos mil vivem sós e oitocentos e cinco mil vivem
acompanhados de outros idosos.
No outro extremo (embora não seja meu propósito essa análise) temos
muito menos jovens e surge pela primeira vez um elevado número de bebés
(recém-nascidos) abandonados na maternidade.
Mas neste país de contrastes, onde independentemente da idade o número
de pobres é cada vez maior, em que o drama do isolamento, da solidão, do sofrer
em silêncio, dá origem a depressões, ao desistir de viver, ao suicídio, à
terrível e desumana situação em que o nosso vizinho morreu, mas que só passado
semanas é que nos apercebemos.
Esta forma triste (mas real) de abordar a quadra natalícia, pretende
agradecer e reconhecer humildemente o trabalho de um homem de Santa Marta e de
um movimento da nossa igreja.
De forma simples, como normalmente acontece com todos aqueles homens,
para quem o SER é muito mais importante que o TER, fui abordado no fim da missa
dominical pelo Sr. José António Novo, que gostava de me oferecer uma coletânea
de textos, onde constam todos os artigos publicados no nosso Betânia do Lima,
desde março de 1972.
No domingo seguinte, fez-me a oferta e apelou a que eu a divulgasse,
porque é um trabalho que tem custos (papel e encadernação) e a condicionante
material é para ele muito importante.
Peço Sr. Novo que me saiba compreender e perdoar, mas eu não podia
deixar fechado no seu “cofre” um testemunho de vida tão importante, não apenas
“memórias de uma vida…”, mas pelos valores sociais e humanos que transmite,
pelas causas a que se dedicou, pela coerência de pensamento ao longo de mais de
30 anos (coisa rara nos dias de hoje) e porque estão registados os momentos
mais importantes da nossa freguesia.
É um testemunho de vida que deveria ser refletido por todos,
fundamentalmente pelos jovens, até para que tenham a certeza que ainda há
pessoas que nós conhecemos e que nos podem servir de referência.
Obrigado Sr. António Novo.
O movimento a que pretendo fazer referência, Movimento de Caridade
Cristã, intimamente associado ao Sr. Novo e a muitos que com ele trabalharam (e
trabalham) de forma voluntária e solidária e que, ao longo de mais de 30, anos
têm apoiado aqueles que precisam de uma “mão amiga”, sendo hoje sentidas de
forma diferente e, provavelmente, mais gravosamente.
A solidariedade intergeracional esteve sempre presente, souberam com
mestria e discrição dedicar-se a quem precisava, disponibilizando uma telha, um
pão, um escudo ou, simplesmente, atenção. Serve de exemplo para os dias que
vivemos em que a pobreza não está só na falta de dinheiro, antes, também, na
ausência de valores.
Para não alongar mais, termino com uma citação do J. A. Novo, referente
ao Natal de 1988, artigo 94, pág. 153/154 – “Natal é o amor que, nascendo numa
gruta, cresce e enraíza no coração do Homem” – “Natal é a mensagem de esperança
duma vida nova que nos torna mais solidários com os nossos irmãos”.
Feliz Natal e Bom Ano.