Por Carlos Antunes
É impressionante a ação pedagógica exercida por muitos daqueles que contribuíram para a atual situação financeira e económica e que vivem no topo da fartura e abundância quando dizem: “não podemos continuar a viver acima das nossas possibilidades”. Em vez de perguntar o que é viver acima das nossas possibilidades a seguramente mais de 70% dos portugueses, digo: querem que os seus cidadãos se preparem e adaptem à pobreza! É efetivamente a falta de esperança e um designo para Portugal.
Em defesa dos chamados iluminados, surge sempre um argumento (e que eu não ignoro) que a crise é da Europa e do mundo. A que eu replico que é a resposta à fragilidade e submissão da política ao capital e, no caso concreto de Portugal, a medidas (ou falta delas) inadequadas ou inexistentes, não esquecendo aqueles que nos levaram à atual situação.
Isto a propósito de uma medida prevista pelo governo, que passa um pouco à margem da discussão pública e que é muito gravosa para milhões de portugueses – o IMI –, isto é, a atualização do Imposto Municipal sobre Imóveis.
Ora, num momento em que a carga fiscal recai sobre as famílias e os respetivos rendimentos do trabalho, em que os números do desemprego são aterradores e com tendência para aumentar, em que a banca não cumpre por quebra nos rendimentos (o mesmo acontecendo às famílias, porque alguns desses proventos foram vergonhosamente retirados pelo estado, que se pensava pessoa de bem), a atualização do valor patrimonial tributário dos prédios assume-se como uma decisão brutal.
Não podemos ignorar que, fruto da recessão, os imóveis têm hoje menos valor, por isso, como pensar em rever com justiça e precisão o valor tributável em função do mercado? A fazê-lo, neste caso seria para uma redução de impostos. Nem podemos olvidar que foi com grande sacrifício que muitas famílias adquiriram a sua habitação, sem encargos para o estado, sem créditos, movimentando a própria economia, fundamentalmente nos casos de habitação própria. Mesmo em relação à segunda habitação as pessoas investiram, não deixaram o dinheiro debaixo do colchão ou em paraísos fiscais, e investiram depois de pagar os seus impostos.
Reconheço que há prédios antigos ou restaurados que nunca foram reavaliados, aí sim poderá haver um acerto gradual.
Não sou contra o IMI, até por se tratar de uma receita das autarquias, embora, e como é do conhecimento público, muitas vezes esbanjado em obras que satisfazem apenas o ego dos autarcas e são um poço sem fundo em termos de custos de manutenção; contudo discordo com o momento, principalmente pelos argumentos atrás referidos, mas também com o brutal aumento que se adivinha, tendo o próprio governo reconhecido o erro e recuado, limitando os valores máximos do aumento por ano, o que mesmo assim não deixa de ser preocupante e não deixa de ser também uma forma do próprio governo ajustar os cortes para as autarquias, atenuando o impacto à custa do “mexilhão” (os mesmos de sempre).
Isto tem sempre uma enorme capa protetora que é a Troika, mas sabemos que não é de todo assim, pois, caso contrário, o corte na T.S.U. não poderia ter sido suspensa.
Por isso, basta! Não é possível sacrificar mais as famílias! É vital que impere o bom senso.